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Eu penso o teatro como um corpo que perde continuamente sangue. Algumas vezes em que ele vai para as ruas e reencontra a realidade, ele recebe golpes, perde sangue através de feridas que não cicatrizam. O corpo do teatro não pode viver de seu próprio sangue. Sua hemofilia exige que ele se alimente do sangue que vem de outros corpos. Ele tem sempre necessidade de novo sangue, ele não pode sobreviver por ele mesmo.
Existe um teatro hemofílico que nega sua condição: de uma beleza diáfana, em sua torre de cristal, ele é cercado de magistrados e exegetas que o proclamam eterno e empreendem operações de revigoramento através de diágnósticos e teorias. Mas existe um teatro consciente de suas hemorragias, que se afasta do círculo protetor dos sábios e parece se perder em uma realidade que o ignora e o degrada, um teatro que não sabe o que fazer, e que, em colisão com a realidade, sangra.
Você perde sangue, mas se você se recusa a ficar estendido em uma maca, você transpõe uma fronteira que conduz a uma espécie de terra-de-ninguém: atrás de você, se estende o território do teatro; diante de você, uma outra fronteira. Você ignora para qual território ela te leva. Você avança prudentemente, mas com obstinação.
Eventualmente, teus passos te fazem recuar, na direção da fronteira do teatro, e então os sábios e os magistrados sorriem, aliviados. Às vezes, você parece prestes a desaparecer no horizonte e teu destino se afigura como incompreensível. Afinal, quem é você? Um solitário que desaparece no deserto ou alguém que, avançando, e ainda que se perdendo, chega a traçar uma pista?
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Este fragmento foi extraído do livro "L'étranger qui danse" (Maison de la Culture de Rennes et Odin Teatret ApS/1977), e leva a assinatura do diretor do Grupo Odin. A tradução e o título ficaram por conta do crítico de Teatro, Lionel Fischer.
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